quinta-feira, 5 de agosto de 2010

A Fase de Expansão da Sociedade Liberal


Capítulo 2

A Fase de Expansão da Sociedade Liberal
(1870/80 a 1914/18)

Falta a informação de que livro pertence esse capítulo


2. A Expansão da Sociedade Liberal
2.1 A Evolução Econômica
Capitalismo monopolista e imperialismo
2.2 A Nova Expansão Colonial
2.a Aspectos gerais da Expansão Colonial
2.b A ocupação da Ásia
2.c A Partilha da África
2.d A Rivalidade na América
2.3 A Evolução Social e Política
3.a Novas Forças em Ascensão e suas manifestações
3.b Os Problemas Internacionais


2. A Expansão da Sociedade Liberal

Na primeira metade do século XIX, a relação entre a Europa industrializada e o restante do mundo se centralizava no intercâmbio comercial. No início do século XX, porém, a Europa se apropriara de vastas extensões territoriais do planeta, impondo-lhes seu domínio político, bem como subordinara à sua economia as economias dos países não-industrializados. Seguiam-na bem de perto os Estados Unidos e o Japão. Por que e de que maneira se estabeleceu essa força expansionista num intervalo de tempo relativamente curto?

Examinando a situação das potências da época, verificamos a ocorrência de mudanças significativas em sua organização econômica, social, política e cultural. Um estadista daquele período assim se manifestou a esse respeito:

“Passaram-se os dias das pequenas nações; chegou o dia dos Impérios.”
[1]

Ou, como escreveu o historiador inglês Barraclough

“... poucos historiadores teriam negado que o novo imperialismo era uma expressão lógica e uma conseqüência dos progressos econômicos e sociais dos países industrializados...”
[2]

Dentre as mudanças significativas do período ressaltam-se o surgimento das grandes empresas, a tendência à monopolização, uma nova política econômica de caráter protecionista, um impulso colonial de novo tipo que promoveu a partilha de quase todo o planeta, o advento da democracia liberal e o aguçamento das rivalidades internacionais.

As páginas que se seguem analisarão os processos de mudança e suas conseqüências para a história européia e mundial.

2.1 A Evolução Econômica – Capitalismo Monopolista e Imperialismo

1.a A partir, aproximadamente, de 1860/70, tendem a acelerar-se determinadas transformações ligadas ao funcionamento e à própria organização geral do sistema capitalista, especialmente no nível econômico.

Verifica-se progressivamente, no sistema capitalista, a alteração tanto do número global quanto das dimensões médias das empresas – há, relativamente, um número cada vez menor de empresas, porém agora são grandes empresas. Modificava-se também a constituição do capital destas – as de caráter individual ou familiar cediam terreno às sociedades anônimas.

Tais fatos ocorreram numa época de agravamento das crises periódicas do sistema e de conseqüente intensificação da concorrência entre os produtores, numa luta dia a dia mais violenta pelos mercados internos e externos.

Com isso, o “jogo liberal”, ou seja, a livre concorrência, a livre determinação dos preços pelas leis da oferta e da procura, o poder decisório, em última instância, do consumidor, foram todos sendo relegados a um plano secundário. O capitalismo tornou-se na prática cada vez menos “livre”, tal a capacidade do grande capital e do Estado de intervirem sobre as condições de funcionamento do mercado. Apesar de tudo, sobreviveu a ideologia do liberalismo econômico – e os pressupostos da teoria econômica a ela ligados – de modo que, quanto mais “monopolístico” se tornava o capitalismo, mais exaltada era a fé liberal.

Não poucos historiadores e economistas referem-se a tais acontecimentos com a denominação de “transformações estruturais do capitalismo”. Daí resultam dúvidas e confusões, pois, na verdade, os aspectos que constituem os componentes essenciais do sistema não se modificam (propriedade privada dos bens de produção e apropriação privada do excedente produtivo). O modo de produção capitalista continua a ser o mesmo. Seu funcionamento, algumas de suas manifestações mais flagrantes, estes sim, aparecem ora mais, ora menos modificados, mas nem por isso podemos aceitar que se trate de “outro” sistema – “pós-capitalista”.

As transformações acima indicadas tiveram correspondências diversas na constelação de elementos constitutivos da formação econômica e social capitalista, como é óbvio, daí o desenvolvimento a longo prazo, já em pleno século XX, de teorias concernentes à superação ou regeneração do capitalismo que se expressam em torno da ideologia do “neocapitalismo”.

1.b O funcionamento mesmo do sistema do capitalismo acarretou, já na segunda metade do século XIX, o início de suas transformações. A livre concorrência, associada ao avanço científico e tecnológico, tendia a acentuar, de um lado, o problema dos custos de produção, a fim de garantir ou ampliar o mercado (e garantir, em conseqüência, a realização da taxa de lucro) e, do outro, a necessidade de investir cada vez mais em equipamentos sempre mais complexos e caros. Ocorreu assim um acentuado aumento do chamado capital fixo.

Simultaneamente, convém lembrar, as crises econômicas, conjunturais e estruturais, multiplicam-se conforme o sistema se expande, a tal ponto que, para muitos, elas parecerão inerentes ao sistema, sem que se constituam em ameaça a sua sobrevivência. As crises agravam aqueles problemas já citados, provocando falências, fusões e eliminação de empresas concorrentes. A luta pelo mercado interno e externo aguça-se em tempo de crise.

Faz-se sentir, ao mesmo tempo, a pressão crescente da mão-de-obra, dia a dia mais organizada e ativa em seus diversos sindicatos. A manutenção da margem de lucro satisfatória entre em choque com o que........................................................................................................................faltam as páginas 74 e 75............................
Mercado do aço; na integração horizontal, efetua-se o domínio de um determinado setor (ou fase) da produção de uma mercadoria. Ex: domínio da fase do refino do petróleo e/ou sua distribuição. Também aqui pode haver a absorção de uma ou mais empresas por outra mais poderosa.

Os grandes complexos industriais e financeiros puderam, melhor que ninguém, enfrentar problemas tais como pesquisa básica, custos crescentes de produção e distribuição, crises econômicas etc. Puderam inclusive interferir no mecanismo dos preços, mantendo-os altos. Quando isto acontecia, configurava-se uma situação monopolista.

1.c Os Monopólios

O monopólio puro – domínio de um setor do mercado por uma empresa – não existe. O que se encontra comumente é o oligopólio, que ocorre quando alguns rivais de grande porto deixam de competir e entram em acordo para findar a concorrência e estabelecer preços altos para seus produtos. Pode-se falar da existência de monopólio no sentido de um controle real exercido sobre os preços e o mercado. No final do século XIX um economista já tinha notado que “a intensidade da competição...” quando umas poucas empresas encontram dificuldades crescentes em dispor de sua produção plena e de um preço lucrativo, leva os competidores a fazer algum acordo uns com os outros, que mitigará a severidade da luta.”
[3] E um jornal comercial da Inglaterra anunciava em 1898 que:

“Já temos operando acordos e entendimentos para preços de trilhos, chapas para cascos, caldeiras, lingotes de ferro e outros ramos do comércio de ferro e aço deste país, pelos quais os preços são mantidos satisfatoriamente e se impede sua queda”
[4]

Note-se ainda a influência do desenvolvimento tecnológico a exigir um volume crescente de capitais, a tal ponto que, logo ultrapassado as possibilidades de ser atendida tal demanda apenas pelo empresário capitalista individual, ou pelas empresas familiares, faz-se necessário modificar os métodos de obtenção de recursos. Além disso, as máquinas têm seu tempo de duração cada vez mais reduzido, aumentando com rapidez as necessidades de reposição e de substituição, coisa que a figura tão decantada do capitão de indústria raramente pode atender. Moderniza-se para sobreviver ou ficar obsoleta e perecer passa a ser o dilema da indústria capitalista.

Ocorreram, na segunda metade do século XIX, avanços técnicos muito importantes nos países industriais. Não seria o caso de considerá-los uma “segunda revolução industrial”, como fazem alguns autores, mais sim um conjunto de procedimentos novos que aprofundaram o impacto geral da revolução industrial em andamento.

Graças a novos processos de purificação do ferro fundido e sua mistura com manganês e carvão (processos de Bessemer. Siemens-Martin e Gilchrist Thomas), produziu-se um tipo de aço maleável e resistente, que se tornou um material básico das estruturas. Além disso, a produção em larga escala possibilitou incrível barateamento e difusão do aço (máquinas, construção civil, transportes, objetos de consumo corrente e etc.)

Desenvolveram-se também novas fontes de energia, gás e eletricidade, que foram substituindo gradativamente o vapor. Aplicada a química e metalurgia, a eletricidade provocou o surgimento de novos processos de produção. Vários tipos de motor de combustão interna (de gás, óleo, gasolina) propiciaram o desenvolvimento dos meios de transporte (automóvel, trem, navio). Desenvolveu-se a química sintética, com ampliação em inúmeros campos industriais, a indústria petrolífera, a indústria da borracha e etc.

Estes e outros processos técnico-científicos produziram um impacto muito forte sobre a organização da produção, o tipo de equipamento industrial, a distribuição das mercadorias, a administração das empresas etc. Eles exigiam a reunião de capitais em larga escala para sua realização. O tempo das pequenas oficinas foi ficando para trás e em seu lugar começaram a surgir os grandes complexos industriais e financeiros.

A solução encontrada foi conciliar o gigantismo da organização com novas e maiores fontes de financiamento. Daí a multiplicação das sociedades anônimas, por ações, que permitiam, de um lado, captar as pequenas poupanças privadas quase ao infinito e, de outro, operar fusões e associações entre grupos industriais e financeiros sem maiores problemas, de tal modo que entra em cena com destaque o setor bancário, cujos membros, assumindo papéis decisivos na nova estrutura financeira das empresas capitalistas, dão a impressão de ter atingido um “novo” estágio capitalista: o do “capital financeiro”
[5].

Resultou essa impressão de uma primeira avaliação de uma época de grandes transformações, mas grande fato é que, a par das transformações que se verificam na organização das empresas e na relação entre elas e os possuidores do capital, permanece o sistema em suas bases essenciais, não importando aqui a circunstância de uma possível ou pretensa diluição do capital por força da multiplicação do número de ações em que esse capital se divide.

Na prática, o aparecimento das sociedades por ações significa apenas que certos grupos poderão controlar grandes complexos industriais e financeiros através da propriedade, ou mesmo da simples gerência, de uma parcela bastante reduzida do total de ações (20-30%), pois, estando o restante dividido entre milhares de pequenos acionistas, a participação efetiva dos mesmos nas decisões é puramente teórica, isto é, ilusória.

Até a Primeira Guerra Mundial, pelo menos, os bancos exerceram um papel de liderança nesse processo de crescimento monopolístico, daí a ilusão quanto à existência do chamado capital financeiro. Isso se processou porque quase sempre cabia aos bancos colocar no mercado essas ações; adiantando aos respectivos empresários o seu valor nominal, ficavam os bancos em condições de influir em larga escala sobre a administração dessas empresas. É interessante observar que também na área bancária se processou um idêntico fenômeno de concentração e integração, pela absorção ou eliminação dos pequenos bancos e constituição de grandes sociedades financeiras que, em número reduzido, detinham praticamente em suas mãos as finanças do país (veja-se, por exemplo, o caso do grupo Morgan nos Estados Unidos).

Não devemos acreditar que o processo de concentração e integração elimine necessariamente todas as pequenas e médias empresas. Deixando de lado as variações setoriais que explicariam o porquê da sobrevivência ainda hoje, em setores limitados, de uma estrutura, de uma estrutura baseada nesse tipo de empresa
[6], o fato mais importante é a constatação de que, mesmo nos setores altamente monopolizados, sobrevivem mais ou menos marginalizadas algumas pequenas e médias empresas. Sabe-se que esta sobrevivência não é acidental e nem decorre de uma especial concessão das grandes empresas, pois na verdade essas pequenas empresas não são eliminadas simplesmente porque não há interesse em fazê-lo. Isso porque à grande empresa interessa a permanência de pequenas empresas cuja produtividade baixa encarece seus produtos – essa circunstância permite à grande empresa manter altos seus preços, as pequenas empresas podem dedicar-se a produtos complementares da grande indústria. Em ambos os casos o pequeno produtor fica dependente do grande capital. Um estudioso viu da seguinte maneira o problema do fim do século passado:

“Em todos os campos da indústria... não se constata a diminuição do número total de pequenos negócios... mas a independência econômica de muitos tipos de pequenos negócios se esfacela diante do capitalismo organizado.”

“O pequeno produtor ainda sobrevive em grande número na agricultura... mas o pequeno fazendeiro torna-se mais e mais dependente do crédito e da ferrovia.”
[7]

As transformações desse período fizeram-se acompanhar, como é fácil supor, de todo um cortejo de justificativas ideológicas voltadas para a demonstração não só da necessidade dessas transformações mas até mesmo do caráter benéfico que as mesmas teriam para todos os interessados, isto é, produtores e consumidores. A crítica ao liberalismo admite agora que a livre empresa e, mais ainda, a livre concorrência não constituem um ideal autêntico, uma vez que é posta em dúvida a própria eficácia do mercado como mecanismo auto-regulador. Isso se deve às crises, especialmente as de superprodução, as quais levam os empresários à convicção de que a ordem econômica existente necessita de certas “correções”. Começa-se então a admitir que cabe ao produtor uma certa capacidade, diríamos mesmo um certo “direito”, de intervir no mecanismo dos preços, a fim de controlá-los e impedir que baixem a tal nível que as mercadorias deixem de oferecer lucro quando vendidas. Estamos aí, evidentemente, bem distanciados do ideal primitivo, isto é, da “igualdade” entre o produtor e o consumidor face às condições ditadas pelo mercado.

Intervir torna-se a ordem do dia. Intervir, porém, ao nível da iniciativa privada sem apelar para o Estado, daí a busca de entendimento entre os produtores, facilitada pela nova estrutura das empresas. É assim que iremos ter os vários tipos de concentração e integração geralmente conhecidos como ententes, consórcios, cartéis, trustes e holding.

Nas ententes ou pactos trata-se de verdadeiros “acordos entre cavalheiros”, isto é, um certo número de grandes indústrias resolve fazer um pacto fixando um preço mínimo para a respectiva produção: geralmente este pacto baseia-se tão somente na honestidade dos participantes e é fácil concluir quanto à sua observância em tempos normais, sendo, porém, muito difícil sustentá-lo em época de crise, pois nesse caso uns tentam superar os demais, dando saída da maneira mais favorável possível à sua própria produção. Em alguns casos essas ententes evoluíram no sentido de organizações estáveis chamadas por vezes de consórcios, que se assemelham ao tipo seguinte, o cartel.

O cartel é constituído por empresas dedicadas à produção de similares, as quais se reúnem a fim de estabelecer, mediante acordo, ou uma divisão do mercado ou uma fixação de quotas de produção e venda para cada uma delas, chegando-se quase sempre, como medida de segurança, a estabelecer um escritório ou agência comum de vendas, evitando-se assim, que elas possam vender diretamente ou seus produtos. No cartel, as empresas mantêm sua identidade e autonomia próprias, ou seja, sua personalidade jurídica, muito embora a existência de uma agência comum que controle preços e quotas represente uma limitação a essas características. O problema do cartel é constituído por duas séries de situações: em termos de conjuntura há sempre a possibilidade de no decorrer de uma crise, uma ou mais empresas faltarem com seus compromissos, isto é, venderem além de suas quotas e baixarem os preços respectivos; do ponto de vista da estrutura, o que se observa é a participação, no mesmo cartel, de empresas cuja produtividade é muito diversa, de modo que, sendo os preços fixados ou em função de um termo médio entre os custos ou em função das condições da empresa de menor produtividade, o que vai acontecer é uma margem de lucro considerável para as maiores empresas e uma possibilidade muito pequena de lucro para as empresas menores. Com isso há um desequilíbrio interno mais ou menos constante que, para ser contornado, irá exigir quase sempre a intervenção do Estado.

Ententes, consórcios e cartéis são típicos dos países capitalistas europeus, destacando-se o cartel como modalidade específica da Alemanha, inicialmente.

Nesses Estados europeus não se observam apenas diferenças quanto a tais modalidades de concentração, sendo notória a diferença de atitudes assumidas pelo Estado face a esses processos de concentração.

Na Inglaterra e na França, a concentração e a integração esbarram em leis e preconceitos que visam a proteger o consumidor da ganância do produtor, de tal modo que tais formas de concentração só podem existir mais ou menos à margem da lei, ora toleradas, ora perturbadas pelo Estado.

Na Alemanha, verifica-se o contrário, pois ali é o Estado o grande impulsionador da “cartelização”, considerada essencial ao próprio futuro político e econômico do país. Enquanto na Alemanha o Estado pressionava no sentido da criação dos cartéis e facilitava as punições contra aqueles que faltavam aos seus compromissos dentro do cartel, na Inglaterra e na França não havia condições legais ou administrativas de perseguir e punir um empresário faltoso em seus compromissos como membro de uma entente ou consórcio.

No Japão, devido à própria estrutura em que se formou o capitalismo japonês, os cartéis constituíram a forma predominante assumida pela industrialização, dominados por algumas poucas famílias, porém sob a forma específica dos Zaibatsu.

Nos Estados Unidos, a concentração deu origem à forma característica dos chamados trustes. Nestes há a absorção de uma ou mais empresas por uma outra empresa ou grupos de empresas concorrentes, de tal modo que as empresas iniciais desapareceram por completo. Os trustes podem estar ligados à integração vertical ou horizontal ou a ambas simultaneamente. Dado o seu caráter quase sempre mais visível ou ostensivo, os trustes despertam com mais facilidade a hostilidade da opinião pública e especialmente da classe média. Contra eles foram tentadas inúmeras providências consubstanciadas nas chamadas leis antitrustes. Diante de tais medidas, os trustes mais visados tendem a dividir-se em diversas empresas juridicamente independentes, que representam, na prática, ramos da mesma organização
[8]

Mais complexos que os trustes temos as chamadas empresas “holding”, em grande parte surgidas no final do século XIX como modalidade capaz de substituir os trustes, obrigados a dissolver-se por força de medidas governamentais. A empresa holding, espécie de “supertruste”, é uma empresa que coordena diversas outras empresas, funcionando como uma espécie de sociedade de coordenação técnica que na prática dirige as demais empresas que o constituem, o holding controla praticamente essas empresas, embora em função do mecanismo mesmo que preside às decisões nas sociedades anônimas, nas quais os acionistas, sobretudo os pequenos investidores, quase sempre se abstêm de participar, deixando nas mãos dos maiores detentores de ações, em termos relativos, todas as decisões referentes às empresas do grupo. Oficialmente, o holding exerce apenas uma tarefa de administração.

1.d Uma nova política econômica

As transformações até aqui estudadas produziram um forte impacto sobre a política econômica tradicional (o laissez-faire), conduzindo gradativamente os Estados desenvolvidos à adoção de políticas protecionistas.

Como e por que ocorreu essas mudanças? Estudaremos o problema em dois níveis, as tendências gerais resultantes da estrutura monopolista e as circunstâncias históricas concretas que reforçaram aquelas tendências.

Já vimos que os monopólios lançam mão de uma limitação da oferta de seus produtos para obter preços mais altos no mercado nacional, empresas estrangeiras poderiam oferecer produtos similares a preço mais baixo no mercado nacional, o que seria fatal para os monopólios nacionais. Daí sua exigência de tarifas alfandegárias altas para garantir internamente seus preços. O protecionismo reaparece, portanto, com um sentido novo:

“A antiga política tarifária tinha a função... de acelerar o crescimento de uma industria dentro das fronteira protegidas... Agora as industrias mais poderosas, mais capazes de exportar... e para as quais as tarifas não deviam ter interesse, pedem altas tarifas protetoras”.
[9]

As altas tarifas alfandegárias assumiam uma outra função: a empresa monopolista, na tentativa de realizar exportações, tentava garantir seu sucesso nesse empreendimento vendendo mais barato que seus concorrentes estrangeiros no mercado internacional. Esse procedimento não lhe dava prejuízos porque internamente os preços altos compensavam possíveis perdas no exterior. Esse processo pelo qual as vendas no exterior eram subsidiadas pela situação interna chama-se dumping. Neste caso, as tarifas alfandegárias assumiam a função de auxiliar a conquista de mercados estrangeiros.

Outra tendência geral da estrutura das economias monopolizadas era o aumento constante da exportação de capitais. Os mecanismos garantidores de altos preços (limitação da oferta através da subutilização da capacidade produtiva, dispensa de trabalhadores, diminuição das horas de trabalho etc.) limitavam as oportunidades de reinvestimento, por isso, os capitais acumulados tendiam a buscar áreas (industrializadas ou não) que proporcionassem rentabilidade. Ocorria que capitais de outra procedência nacional podiam estar interessados também naquelas áreas, e podia ocorrer também uma resistência das próprias áreas visadas. Desse modo, a exportação de capitais pressupunha uma certa integração da área receptora no sistema econômico (e as vezes no político) do país exportador de capital. Os investidores pressionavam o Estado para que este assegurasse as melhores condições de investimento externo.

De 1873 ao final do século, caracterizou-se uma situação de depressão econômica e crise social. No setor industrial notava-se estagnação acompanhada de desemprego. Ao mesmo tempo, emergiam novos países como potências industriais de primeira ordem: Estados Unidos e Alemanha, seguidos mais tarde pelo Japão, o que tornava a concorrência mais acesa no mercado internacional. O impacto da crise na Inglaterra, por exemplo, ficou bem claro num relatório da “Comissão Real” de 1886:

“... em razão da conjuntura presente, a demanda de nossos produtos não cresce no mesmo ritmo de antigamente... e nossa posição de principal nação industrial do mundo não é mais tão indiscutível;... nações estrangeiras começam a entre com sucesso em competição conosco em numerosos mercados, dos quais tínhamos o monopólio até então”.
[10]

Também o setor agrícola achava-se em crise devido ao fluxo de produtos agrícolas, principalmente cereais, dos Estados Unidos, Canadá, Argentina, Austrália, Nova Zelândia, que invadiam os mercados europeus, prejudicando seus produtores. Gradativamente, o protecionismo dos produtos agrícolas foi-se impondo como tendência geral. Um de seus defensores afirmava na Câmara dos Deputados da França:

“Quem ousará negar os sofrimentos do agricultor? (grifo organizacional). Os recenseamentos não demonstram que os campos se despovoam mais e mais em proveito das cidades?... Em princípio houve razão para estabelecer a taxa sobre o trigo porque, sem ela, o cultivo teria desaparecido e o consumidor francês estaria à mercê do produtor estrangeiro”
[11]

O conjunto destes problemas suscitados pela depressão resultou na formulação de uma política de expansão e de anexação de mercados externos. Um estadista como Jules Ferry estimulava essa política em 1885 com a afirmação de que:
“Na crise que todas as indústrias européias atravessam, a fundação de uma colônia significa a criação de um mercado”
[12]

As potências desenvolvidas começaram a lançar-se à corrida colonial e imperialista por todo mundo.

2.2 A Nova Expansão Colonial

2.a Aspectos gerais da expansão colonial

A partir do momento em que a Inglaterra – para enfrentar a estagnação econômica, a crise social e a concorrência de novas potências – reforçou os laços imperiais e iniciou a corrida colonial, outros Estados seguiram-na rapidamente. A anexação de vastas áreas do mundo ao sistema econômico e político das nações mais industrializadas se fez então em ritmo acelerado.

a.1 A Natureza da Expansão

Já vimos que a reorganização geral da economia e sociedade nas nações capitalistas mais industrializadas gerou novas exigências econômicas e novas políticas estatais que conduziram à competição internacional e à conquista imperialista. Diferentemente da época anterior – da livre concorrência – cuja ênfase estava no intercâmbio de matérias-primas e alimentos por produtos industrializados, o que importava agora era principalmente exportar para as áreas visadas os capitais disponíveis. Estes capitais chegavam àquelas áreas secundariamente sob forma de empréstimos e principalmente sob a forma de investimentos: em obras públicas (ferrovias, energia elétrica, serviços de gás, transportes urbanos e etc.) e atividades primárias (extrativas ou agrícolas). Todos os setores atingidos ligavam-se direta ou indiretamente ao setor exportador da área sob influência e domínio. Além dos lucros realizados diretamente na produção ou nos serviços, esses investimentos estimulavam o comércio e a própria indústria do país que aplicava os capitais.

A rivalidade no plano internacional arrastou, por vários motivos, os Estados à competição. Desta competição se seguiu uma repartição das áreas “ocupáveis” do mundo, o que se fez de acordo com o poderio de cada Estado empenhado na corrida. Como formulou Cecil Rhodes, um dos maiores animadores ingleses da competição colonial:

“A expansão era tudo e, sendo a superfície do mundo limitada, o grande objetivo da humanidade contemporânea devia ser tomar tanto pedaços do mundo quanto fosse possível”
[13]

Essa divisão não era eterna, pois os ritmos de crescimento econômicos variavam de país a país, e um Estado que se julgasse prejudicado da divisão anterior de mercados ou áreas dominadas e se sentisse suficientemente forte para reivindicar uma redivisão tentaria mudar os acordos anteriores. Daí as ações diplomáticas e até militares.

Além dos motivos gerais já definidos, a corrida colonial surgiu de motivações mais imediatas (ligadas aqueles motivos gerais):

- A necessidade de assegurar vias de comunicação (portos, ilhas, pontos de abastecimento etc.) para áreas onde já existiam posições econômicas definidas; ou a necessidade de criar uma área de segurança em torno do território nacional (anexação por motivos estratégicos ou colônias estratégicas);
- A necessidade de proteger uma área do avanço de rivais, impedindo-os de utilizarem-na em seu proveito (anexação protetora);
- A necessidade de anexar áreas, mesmo que fossem de pequeno valor, mas que poderiam tornar-se importantes no futuro (anexação antecipatória). Como formulou um estadista: “Fomos até Massoua no interesse da civilização e porque talvez uma outra potência teria podido ocupar aquela região... Não podemos permanecer inertes e deixar que as outras potências ocupem sozinhas partes inexploradas do mundo”
[14]

[1] CHAMBERLAIN, cit. Por BARRACLOUGH, G. Introduccion a la historia contemporânea, Madri, Gredos Ed. 1965
[2] BARRACLOUGH, G. op. Cit. P.68
[3] HOBSON, J. A. The evolution of Modern Capitalism, Londres, G. Allen & Unwin Ltd., 1949, p. 169 (1ª ed. 1894)
[4] HOBSON, J. A. op. Cit. P. 170
[5] HILFERDING, A. El capital financeiro. Madri. Ed. Tecnos, 1963.
[6] GALBRAITH, J.K. o capitalismo, Rio, Zahar, 1960
[7] HOBSON, op, cit, p. 212
[8] O’CONNOR, H. O império do petróleo, Rio, Zahar, 1968.
[9] HILERDING, cit. por SWEEZY, op. cit.p, 346
[10] Cit. por VOILLIARD e outros em Documents d’Histoire. Vol.2. Paris. A Colin 1964. p.72
[11] Debate na Câmara dos Deputados, em 2 de maio de 1891, L’Année Politique, 1891, PP, 123-25, cit,por VOILLIARD, op, cit, p.50
[12] FERRY, J. Discurso na Câmara dos Deputados, Journal Officel, em 29 de julho de 1885, cit, por VOILLIARD, op, cit, p.48
[13] Cit, por LANGER, The diplomacy of imperialism, Vol 1. P.77
[14] CRISPI, cit. Por BOURGIN, Les politiques d’expasión imperalistes, p.134.